Esta é a tradução de uma reportagem do jornal espanhol El Mundo, publicada em dezembro de 1994. O texto original pode ser lido aqui.
Rafael, 40 anos, e Paloma, 37, não pensavam em ter mais do que 3 ou 4 filhos quando se casaram. A sua não é uma família numerosa, mas sim multitudinária, uma raridade em nossa época. Os Benitez são o casal espanhol que dialogou com o Papa no recente encontro com as famílias. Como vivem? Como chegam ao fim do mês? Como se organizam? Como educam sua interminável prole?
Estacionado na esquina de uma rua de Granada, onde vivem, vê-se o furgão, uma Citroen C25D branca com três fileiras de assento, e se pensa: "são eles". O veículo possui treze assentos, nove deles são oficiais com seus encostos de plástico preto, e quatro são "piratas", correspondentes a dois assentos geminados que brotaram milagrosamente do porta-malas. No porta-luvas, vermelho sobre preto, uma lata de Coca-Cola.
No fone da portaria se ouve o rumor característico de "broncas", e se sobe com certa prevenção as escadas. Imagina-se uma multidão de narizes pingando, joelhos sujos, boladas na parede e choradeira, uma mistura de A grande família e dos contos dos irmãos Grimm, com um lenhador pobre e sua fileira interminável de crianças. Mas quando se entra na casa dos Benitez, parece que erramos de endereço.
É um lar cálido, onde tudo parece limpo e recolhido, onde não se ouve uma voz mais alta do que a outra, embora não falte o contraponto de choros e risos. No vestíbulo se vê uma salão decorado com austeridade, mas também com graça. No quintal, banhos de sol.
Rafael, com sua barba de navegador solitário e seus olhos azuis, parece provado pela vida.....e pela tropa que tem ao seu encargo. De Paloma, cabelos curtos, olhos escuros, doce e tímida, ninguém diria que teve catorze partos, uma cesariana, e que tem mais um filho a caminho..
Começam a aparecer cabecinhas vermelhas e olhos insultantemente azuis, que te examinam em silêncio. Os irmãos Benitez são esbeltos, formais e disciplinados. A meninas são de chamar a atenção..
Duas coisas chamam a atenção ao vê-los. São extraordinariamente tranqüilos, a antítese da confusão, do estresse, da cara de velocidade. Correm, riem e jogam, mas sem fazer escândalos, como se uma mão invisível abaixasse o volume. No início se pensa que a harmonia durará pouco, que tudo mudará quando ganharem confiança, mas convive-se com eles um dia inteiro, incluída uma agitadora sessão fotográfica, e continuam a transmitir a mesma sensação de calma e serenidade..
Há um segunda coisa. Apresentam os filhos: Flor, Alma, Belén, Francisco Pedro, Jorge, Maria, David, Pablo, Clara, Daniel, Jesús, Miguel, Elena e Lídia, e parece que todos são gêmeos e que seus pais devem ser incapazes de saber quem é quem, e quem vem depois de quem. Nem tudo ocorre desordenadamente. Às vezes, o pai se dirige à turbamulta de irmãos e chama a um por um nome que não é o seu, e depois de ter queimado três ou quatro cartuxos, recorre ao "Como-te-chamas, vem aqui!"..
O certo é que, mais do que uma família, parecem uma população. Quinze filhos e mais um na lista de espera. Sete filhos e oito filhas. A maior, Flor, uma garota moderna e estilosa que estuda Filologia Semítica, tem vinte anos; e a menor, Lídia, uma garotinha que te olha com ceticismo de sua cadeirinha, um ano recém completado. O máximo de diferença entre um e outro é dois anos, e só há quatro destes oásis demográficos..
Quinze e vem mais um! Dezesseis preocupações; dezesseis trabalhos; dezesseis preocupações de nutrição, limpeza, vestimento e manutenção; dezesseis cabeças para ensinar e educar; dezesseis infectados de sarampo, catapora e outras doenças. .
E tudo isto para Rafael e Paloma, que não pensavam em ter mais de três ou quatro filhos quando se casaram, quase adolescentes, em Castellón, de onde são naturais e onde vivem seus pais. Tinham 20 e 17 anos respectivamente, e suas economias não davam para muito. Os dois procediam de famílias simples. Ele, concretamente, era filho de um guarda civil, corporação à qual chegou a pertencer, depois de recolocar-se na guarda militar. Os dois gostavam de crianças, mas moderadamente. Ainda que pareça uma coisa bonita, quando Paloma chegou à segunda gravidez, aquilo lhe pareceu uma multidão. Por eles mesmos, teriam parado aí.. E não apenas isto, senão que se teriam convidadado mutuamente a plantar batatas. Tinham problemas. Tinham se casado sem se conhecerem profundamente, e as surpresas começaram a aflorar á superfície, como o petróleo de um petroleiro afundado. Cada um vivia por si, não se suportavam e planejaram a separação. Chegaram a ficar alguns dias fora de seu domicílio conjugal. .
Superaram o aperto graças à sua fé religiosa. A história dos Benitez não se pode entender sem este fator. Conheceram, através de uma paróquia, o Caminho Neocatecumenal, um movimento evangelizador da Igreja Católica, e se fizeram missionários seculares. Reconstruíram seu casamento, perdoando-se e aceitando-se mutuamente, tal como eram.
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